segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Capítulo 1


- Acaba logo com ele! Apaga ele de uma vez que esse traíra não tem perdão.
Todos os que estavam por perto tinham a certeza de que Luis dizia a verdade sobre a traição de seu amigo de infância, João de Castro. Afinal, os dois sempre foram tão unidos que seria impossível Luis estar errado sobre as acusações postas.
As palavras às vezes teêm esse poder. Não são poucos os exemplos de frases ditas no impulso da raiva ou mesmo no calor de uma paixão desenfreada que não passam de palavras ao vento. Palavras, palavras, palavras.
Mesmo num discurso, onde elas normalmente estão bem postas, com ideias e ideologias muito bem fundamentadas, elas não passam disso: palavras.
No entanto, as palavras, como neste caso, podem nos enganar, e naquela tarde chuvosa de julho estavam a enganar toda a gente presente, os vizinhos e os colegas de anos que não podiam deixar a traição de João de Castro impune.
Somente João sabia o que mais ninguém, além de Luis sabia: aquelas não eram palavras reais. O ódio era real. A raiva e o desejo de matá-lo que ele via claramente nos olhos do seu amigo estavam ali, mas as razões e os desejos escondidos nas palavras só ele via, mais ninguém.
Talvez Clara se ali estivesse soubesse da verdade. Justamente ela, tantas vezes usada pelos dois para se atacarem e se provocarem, seria a única capaz de compreendê-lo. Clara conhecia bem à Luis. Mas, verdade seja dita, o Luis que Clara conhecia era o “rapaz ingênuo e romântico que tu eras antes de entrar para a luta armada”
João nem pensava nisso, porque tinha a certeza de que ela ali não apareceria até que Luis apertasse o gatilho de duplo alvo, pois no momento em que seu amigo lhe tirasse a vida, estaria também a cometer suicídio. Não é possível viver por muito tempo a ter a consciência a cobrar-lhe o preço pelo desejo reprimido e oprimido.
Ajoelhado na calçada, a ter a correr pelos joelhos a água da chuva forte, por um instante, ele se arrependeu de também ter sido fraco. De ter-se deixado reprimir e de ter escamoteado o amor que lhe tinha para nos braços e boca de Clara Assunção provocar tamanho ódio como o visto nesta cena.
Com os olhos fechados de pavor, lembrou da última vez que a beijou. A última vez também foi a primeira a despertar-lhe o desejo. A primeira de tantas vezes que de fato sentiu seu cheiro e seus os lábios delicados de garota a arrepiar-lhe e a enrijecê-lo como nunca antes acontecera. João de Castro desde pequeno esperava por aquele momento, mas pouco tempo depois de ficar amigo de Luis, a vontade de beijar Clara passara.